- Ah! Ele é tão
lindo - exclamou a tia.
 
 
 
    - Que menino tão
fofo - Disse uma amiga.
    - Será um forte
guerreiro - expressou a avó.
    - Cuidará das
empresas do vovô - Impôs o avó.
    - Nada disso -
verbalizou o pai - será doutor, poliglota, exímio praticante de artes marciais.
A mãe interrompendo toda discussão e falou:
    - Parem todos com
isso! É só um bebê e vocês já estão impondo ao menino um destino, uma história
pré-moldada,  sem escolhas. Ele é meu
pacotinho, e por hora isso basta.
    - Bem, está na
hora de irmos e deixarmos vocês descansarem e curtirem o bebê - a avó
completou.
    - Este quarto é
lindo! Parabéns Suelem pela escolha da decoração, esse tom de azul caiu muito
bem ao ambiente - expôs a amiga reiniciando a conversa, agora sobre outra
temática. 
    - E essa
lembrancinha, que mimo um pequeno lutador de taekwondo - prosseguiu a tia.
    Aquele era o
primeiro dia em casa após a saída da maternidade. Tudo era novo para aquele
jovem casal e seu primeiro filho. O recém-nascido batizara o quarto desde sua
primeira troca de fraldas, parecia que propositadamente mirara a camisa
especial que seu pai produzira exclusivamente para aquele momento. A criança,
desde que nos braços de sua mãe, era bastante calma; criam que o odor do leite
materno e o som dos batimentos cardíacos servia-lhe como calmante, recostava-o
ao peito e tudo se fazia sereno. Mas para além das intensas conversas sobre a
decoração, as trocas de fraldas e planos para o pequeno homem que compunha a
família como primeiro bisneto, neto e filho iniciou um profundo desalento do
bebê.
    - A culpa é de
vocês mulheres que não cessam todo esse falatório sobre cores, roupas e
presentes - indignado e sobrepondo a voz aos demais disse o avô.
    - Vocês que não
pararam de tratar de arranjar o futuro do pequeno anjo, até casamento já lhe
providenciaram, o garoto há de ter ficado arretado - retrucou a avó. 
    - Meu Deus! Que
faço mainha? com olhar desesperado questionou-se a mãe.
    - Vamos tentar
investigar - interpôs-se a tia.
    - Já o amamentou?
falou o pai dirigindo-se a sua esposa.
    - Claro que sim -
respondeu.
    - A fralda está
limpa?
    - Acabamos de
substituí-la - Em desespero dizia o pai.
    - Ele já fez o
cocô hoje? Alguém perguntou.
    - Não! -
arregalando os olhos informou a mãe.
    Todos chegaram à
conclusão que o problema era intestinal. Constipação intestinal, concluiu o
pseudomédico da família, o tio que até o momento encontrava-se no canto da sala
jogando vídeo game. 
    - Que devo fazer?
a mãe insistia.
    - Vamos levá-lo
ao médico, simples - dizia o pai.
    De pronto
organizaram a mala, que não havia sido desfeita, dentro do porta malas e
seguiram os pais e o bebê para o pronto socorro. Optaram por levá-lo ao
hospital mais completo que conheciam, possuía equipamentos e uma exímia equipe
técnica, não queriam correr o risco de terem de fazer alguma transferência caso
fosse necessário. Adentraram o portão do hospital com semblante tenso como numa
corrida implacável em busca de socorro, o choro do bebê completava a tensão
como uma trilha sonora desesperadora. 
    - Por favor,
senhora - dizia o pai se dirigindo a enfermeira - peço que priorize o meu
filho, acabamos de sair com ele da maternidade, possui apenas 3 dias de
nascido. 
    - Calma pai, tudo
ficará bem, comunicarei ao Doutor a situação e o atenderemos o mais breve
possível. 
    Enquanto os pais
buscavam socorro para o bebê, em casa, toda a família intercedia pela criança
com orações e criam que tudo ficaria bem e aguardavam ansiosos o retorno
daquele casal e do pequenino. No hospital, a mãe em desespero não sabia mais o
que fazer para reduzir o ensurdecedor choro de seu filho. Nem mesmo o acalento
do leite materno era aceito pela criança. 
O pai preenchera o cadastro e logo foram chamados pelo pediatra de plantão.
    - Olá jovens, que
há com o pequenino?
    - Ele está nesse
choro há horas, seria alguma constipação intestinal?
    - Que nada, isso
é apenas especulação de meu cunhado metido a sabichão, doutor - contestou o
pai. 
    - Mas é que desde
cedo ele ainda não fez o número dois, o senhor me entende não é, doutor?
    - Sim, sim. Ponha
a criança nessa cama e levantem sua roupa, vamos analisar sua barriguinha. 
    - Doutor, por que
ele tá ficando assim tão vermelho? Sou mãe de primeira viagem, não entendo nada
de bebês ainda, achei que os manuais que li durante a gestação me ajudariam,
mas vejo que não.
    - E esses sons?
Que é isso doutor, o que está fazendo? - indagou o pai.
    - Massagem
abdominal - respondia o médico.
    Os barulhos
feitos pelo bebê constrangeram os inexperientes pais.
    - Acho que
precisará trocar as fraudas. - disse o médico enquanto abria a frauda do bebê e
se certificava que ele concluíra o número dois.
    Ainda na sala os
pais cobriam o nariz tentando reduzir o odor ambiente que penetrava as narinas.
    - Podem trocá-lo
aqui mesmo, sem problemas. 
    - Obrigado,
doutor. Bem, é um caso de constipação intestinal, correto?
    - Sim, sim.
Acenou o médico.
    O casal se
entreolhou e ele pediu para que ela não comentasse nada. 
    - Vamos para
casa.
    -Está bem - disse
ela enquanto sacava o celular e telefonava para a mãe para contar-lhe que o
bebê estava bem e que já retornavam para casa.
    - Mas o que
houve? Indagou a avó.
    - Constipação
intestinal, tá bem? Pode contar a seu filho - interpôs-se o pai respondendo-lhe
um pouco ríspido.
    - É! fedeu -
pensou a mãe.
Amanda Rocha é professora e cronista.


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